Hoje vamos saber um pouco mais sobre nossas estagiárias, acadêmicas de História, do projeto “Resistência em Arquivo – memórias e histórias da ditadura no Brasil”, o qual possui entre seus objetivos, a elaboração de um catálogo seletivo dos processos originados a partir da atuação da Comissão Especial de Indenização/SSP recolhidos ao APERS em 2009.
Bárbara Cristine da Silva Trindade, 23 anos, estudante do 2º semestre na Unilassale. É estagiária no APERS desde maio de 2013.
Clarice Machado Gama Hausen, 28 anos, estudante do 7º semestre na FAPA. É nossa estagiária desde abril de 2013.
Paula Blume, 22 anos, estudante do 5º semestre na UFRGS. Estagia conosco desde dezembro de 2012.
Blog do APERS: Como e porque você decidiu cursar História?
Bárbara: Sempre gostei desde criança de coisas antigas, como eu tenho asma, e fico doente fácil quase nunca ficava brincando com as outras crianças na rua. A minha mãe sempre me cuidava para eu ficar mais dentro de casa, principalmente em dias frios, para eu não adoecer, o que me incentivou a ler, e gostar de ver documentários sobre história, sem falar que na escola meus professores e disciplina preferidas eram de História, sempre tive excelentes professores que contribuíram para despertar em mim a vontade de cursar História.
Clarice: Foi por uma motivação, ao ver alguns dos meus professores de história, no final do ensino médio. As aulas eram ricas de conhecimento e eu queria também entender, como eles, todo esse universo. E, depois, já na faculdade, fui compreendendo, aos poucos, a imensa atuação da história em vários setores da sociedade, pra não dizer em todos, e isso, me torna cada vez mais consciente do que é história e sua dinâmica, tanto de estudo quanto prático no social.
Paula: Quando eu estava cursando o Ensino Médio, em escola pública no turno da noite, comecei a sentir com muita força a precariedade de nossas escolas públicas, a evasão escolar era, e ainda é, muito presente e os motivos são desde as alunas e alunos não terem dinheiro para a passagem até o cansaço extremo de nossas professoras e professores devido as péssimas condições de trabalho, passando pela precariedade estrutural dos colégios. Isso começou a mexer comigo e a partir dai decidi que queria fazer alguma licenciatura e atuar politicamente nessa categoria, claro que não tinha a visão de atuar politicamente, mas sabia que de alguma forma, sendo professora, estaria fazendo alguma coisa. Comecei, a partir disso, a pensar em cursar História e assim foi, terminei o Ensino Médio e prestei vestibular, comecei na FAPA em 2009, passei pela UNIPAMPA em 2010, por fim, em 2011 entrei na UFRGS e hoje estou na metade do curso.
Blog do APERS: O que representa para você desenvolver uma atividade de estágio em uma instituição como o APERS?
Bárbara: Representa poder contribuir com meu trabalho, e com certeza aprender mais, sobre vários assuntos, inclusive uma atividade que tem uma estrutura sólida e conta com uma excelente supervisão, que dá todo o apoio que precisamos.
Clarice: Sempre tive um certo interesse em trabalhar no APERS, em estagiar nesse local, por vários relatos de amigos, que aqui já trabalharam, sempre eram relatos positivos. Aqui é o primeiro estágio que fiz, até então, que trabalha mais próximo da área de história propriamente dita, por lidarmos com processos e documentos de fonte primária. Onde é possível, nesse espaço, ter contato e vivencia com historiadores, arquivistas e restauradores o que proporciona um trabalho e um diálogo riquíssimo.
Paula: Estar em contato e poder atuar na área que estudo está sendo essencial para meu aprendizado e crescimento, além do mais, é um exercício muito bom, pois nada melhor que a teoria vinculada diretamente com a prática para poder avançar no conhecimento. Além do contato direto com as fontes e os documentos, estou em contato com outras áreas, como a Arquivologia, e aprendo muito com essa aproximação. Também o contato informal com as colegas e os colegas é um momento muito rico, pois debatemos questões que nos cercam e cercam nosso mundo, assim vamos trocando ideias e conhecimentos sobre um todo, desde o universo histórico ao universo arquivístico e o elo entre os dois, passando por questões de nosso cotidiano.
Blog do APERS: Você poderia comentar um pouco sobre o trabalho que vens desenvolvendo no APERS?
Bárbara: O meu trabalho é muito interessante, pois a medida que leio os processos consigo viajar um pouco na história, e compreender o que cada requerente viveu no período, consigo compreender o que de fato ocorreu e simplificar de forma clara e objetiva em um verbete.
Clarice: O projeto Resistência em Arquivo, o qual faço parte da equipe, produz verbetes sobre os processos de indenização, que as pessoas receberam do estado, entre, aproximadamente o período de 1997 a 2002, por terem sofrido as represálias do período da ditadura civil-militar no nosso estado. Esse projeto, através dos relatos descritos pelos requerentes e através, também, da documentação factual gerada nos processos, nos insere em um tempo histórico crucial para analisarmos muitos “ranços” que existem e persistem até hoje, tanto na esfera social quanto na espera político administrativa da união.
Paula: Estou participando da elaboração de um catálogo seletivo sobre uma documentação referente a Ditadura Civil-Militar brasileira. Essa documentação é da Comissão Especial de Indenização aos ex-presos políticos daquele período, ela foi aberta em 1997 pela Lei nº 11.042, em que o Estado do Rio Grande do Sul reconhece que cometeu crimes de lesa-humanidade contra pessoas de qualquer posicionamento político contrário as ideias dominantes da época. A Comissão durou até 2002, se não me engano, mas não passou muito disso, e desde 2009 a documentação está sob a guarda do APERS. O trabalho que desenvolvemos é a leitura integral dos processos e a elaboração de um catálogo que consta local de prisão, a vinculação ou não com partidos e organizações políticas, os motivos da prisão, as agressões físicas e psicológicas cometidas pelo aparato repressivo do Estado, entre outras informações. É um trabalho de resgate da memória de pessoas que foram vítimas do Terrorismo de Estado da Ditadura de Segurança Nacional, que foi imposta em todo o Cone Sul a partir do golpe civil-militar no Brasil em 1964. A documentação deixa evidente que não só militantes de organizações de esquerda foram atingidos, mas a repressão invadiu a vida de agricultores, de comerciantes, de civis sem vinculação política e com mais intensidade aqueles que eram vinculados a organizações ou mesmo apenas simpatizavam com outras contrárias as da ditadura. Ao entrar em contato com essa parte da História, que nos é negada a tanto tempo, percebemos ainda mais a importância desse trabalho, pois vivemos em um tempo muito carregado de um entulho autoritário herdado daquele período e convivemos com a impunidade dos crimes cometidos pelo Estado de ontem e de hoje. Assim, resgatar essa História, está vinculado a luta por memória, verdade e justiça, no sentido de que nunca mais aconteça e que se aja, pois crimes cometidos pelo Estado ainda acontecem, principalmente em nossas periferias contra a juventude negra e contra a classe trabalhadora.
Blog do APERS: Algum recado final?
Bárbara: Gostaria de utilizar o espaço para agradecer a oportunidade de fazer parte do APERS. Muito Obrigada.
Clarice: Com essa possibilidade que surgiu, através de uma amiga, para vir trabalhar no APERS, fez com que eu voltasse a acreditar que, de fato, ainda existem espaços, embora poucos, em que o diálogo, a participação de todos os envolvidos no trabalho é realmente escutada e tem o mesmo peso e credibilidade dos mais experientes da casa. E, assim, que todos os processos do projeto Resistência em Arquivo, tiverem seus verbetes publicados e prontos para o público acessar, já convido a todos, a verem mais de perto a nossa história. Parabenizo o APERS pelo espaço e pela possibilidade de expressão.
Paula: Gostaria de agradecer pelo convite de falar e dizer que todas e todos que estão envolvidos nesse projeto estão bem engajados e trabalhando muito com toda a sensibilidade que esse tema, traumático, exige. Convivemos todos os dias com histórias muito duras, os relatos das torturas, das humilhações e dos traumas são marcantes e pesados; entendemos o quanto é difícil relembrar os traumas, pois lembrar é viver de novo. Por isso, a dureza misturada com a sensibilidade nos dá o combustível para seguir uma luta, por eles que não estão mais entre nós, que foram mortos e desaparecidos, e pelos que sobreviveram e querem justiça, nossa luta continua, dentro do Arquivo no resgate a História e na vida por uma sociedade justa e igualitária.
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