Seguindo a proposta de revisitarmos as publicações que resultaram das doze Mostra de Pesquisa APERS organizadas até o momento, hoje vamos relembrar algumas apresentações sobre Arquivos e sobre o trabalho arquivístico.

2016.04.20 Revisitando II

     Na VI Mostra de Pesquisa, Ana Carla Sabino Fernandes tratou da atuação dos funcionários da província do Ceará, antes ainda da criação do Arquivo Público do Império daquela província (1865), e o significado que deram aos documentos que hoje compreendemos como históricos. Para tanto, partindo de Pierre Nora, Ana Carla abordou a questão da “memória arquivística”, que não necessariamente está representada, guardada, acumulada em Arquivo (lugar), mas que “é norteada por uma prática social de políticos eruditos e de funcionários públicos treinados, dignos da acumulação documentária, baseada no registro, no colecionismo […] anteriores ao Arquivo”. Na tentativa de compreender a história do Arquivo Público do Estado do Ceará, ela considerou o conceito amplo de documento como fonte e objeto de estudo e percebeu tanto a instituição quando o documento em diferentes processos de disputa da memória. Ao tentar responder a esse problema no artigo intitulado Entre papéis, pennas e livros: os archivistas na província do Ceará, a autora apresentou o Arquivo Público do Estado do Ceará (APEC), instituição subordinada à Secretaria da Cultura do Estado do Ceará (Secult-CE), que custódia um acervo com documentos datados entre o século XVIII e XX, formado por correspondências, processos criminais, relatórios, inventários, mapas e demais tipos documentais provenientes dos poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e de particulares. Sabendo desse recorte, já podemos imaginar tratar-se de um dos principais espaços para pesquisa em história no Brasil.

    Na IX Mostra, Carlos Dinarte de Oliveira Keppler, Isabel Cristina Arendt e Marli Pereira Marques trabalharam com informações a respeito do Memorial Jesuíta-Biblioteca da Unisinos, que faz parte do Centro de Documentação e Pesquisa (CEDOPE), e abordaram aspectos da organização deste fundo documental, da história da instituição que o gerou e da metodologia de trabalho utilizada na sua organização e difusão. As finalidades específicas do Memorial compreenderiam, de acordo com os autores, a guarda, conservação, preservação e disseminação de acervos bibliográficos, documentais, científicos e artísticos produzidos e reunidos, em sua maioria, pela Província do Brasil Meridional da Companhia de Jesus nos últimos 150 anos. Dentre os acervos custodiados por este Memorial, encontram-se mais de 200 mil livros e periódicos que compõem coleções provindas dos seminários e paróquias sob a responsabilidade de padres jesuítas, reunidos por eles desde o século XIX. Encontram-se também livros considerados raros, editados entre os séculos XV e XVIII, que somam em torno de 2.600 obras. Além disso, conforme as autoras, o Memorial guarda acervo arquivístico, de caráter histórico e, portanto, permanente, também relacionado com a atuação dos jesuítas no sul do Brasil. São fundos documentais referentes a temas como cooperativismo e imigração, compreendendo arquivos pessoais e institucionais, alguns produzidos por setores da própria Universidade, especialmente a atuação dos jesuítas. De acordo com os autores, a organização e disponibilização de fundos documentais demonstram o reconhecimento que o Memorial Jesuíta possui sobre sua o fato de que acervos restritos à responsabilidade de instituições privadas também podem ter uma função pública.

     Na V Mostra, Enrique Padrós apresentou o trabalho de nome Os arquivos virtuais sobre os regimes repressivos, especialmente, o National Security Archive (NSA), que disponibiliza, em suporte papel e em meio eletrônico, os documentos desclassificados pela administração estadunidense. A documentação contem uma diversidade de informação alimentada pelos órgãos de inteligência de cada uma das ditaduras e pelas organizações de oposição dos governos autoritários da América Latina, confirmando a conexão entre os EUA e aqueles regimes. Segundo o autor, os arquivos virtuais são aqueles que resultaram da digitalização de seus fundos. E esse é o caso do NSA, fundado em 1985 por jornalistas e acadêmicos que haviam obtido documentação governamental através da lei da Liberdade de Informação, cujo acervo o transformou no arquivo governamental de documentação desclassificada de maior relevância mundial. Por fim, Padrós ressaltou que emergência de arquivos virtuais resultam de condições tecnológicas, por um lado, “mas também podem ser mecanismos compensadores na agilização de processos, demandas reparatórias e de produção de conhecimento histórico após décadas de entraves e paralisia político-sociais”, por outro.

    Na X Mostra, Mauro Sérgio da Rosa Amaral apresentou o trabalho Os Arquivos Sonoros do Judiciário: breve relato sobre a migração de suporte de fitas magnéticas de áudio cassete no tribunal Regional da Quarta Regional (TRF4). A partir de um estudo de caso, que resultou no trabalho de conclusão de curso de Arquivologia da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação, o autor escreveu sobre a migração de suporte e a estruturação de procedimentos padronizados para a implantação do programa de digitalização de fitas magnéticas de áudio daquele Arquivo. No mesmo evento, Carmem Schiavon e Sara Orcelli dos Santos apresentaram o trabalho intitulado Conservação e Difusão do acervo de história demográfica do CDH-FURG: preservação de um patrimônio documental Rio-grandino, que abordou relações entre a teoria e a prática arquivística, com vistas à organização e conservação que foram aplicadas no Acervo de História Demográfica, localizado no Centro de Documentação Histórica “Professor Hugo Alberto Pereira Neves” na Universidade Federal do Rio Grande. Ao mesmo tempo que socializaram reflexões, prestaram algumas informações a respeito do Acervo e do Centro, que se transformou em local de pesquisas e práticas pedagógicas dos Cursos de História, Arquivologia e Biblioteconomia da Universidade.

     Na XI Mostra, Angélica Bersch apresentou o trabalho de implementação de um arquivo fotográfico na empresa Renner Hermann S/A. No texto, a autora relata o processo de negociação com os proprietários, que possuíam a intenção de organizar e de preservar os documentos. Com o objetivo de demonstrar a importância desse tipo de trabalho, mesmo quando em um formato simplificado, a autora propôs um diálogo sobre as condições de implantação e de acesso aos arquivos históricos, sobretudo em instituições privadas. Ela defendeu que, nessas situações, o trabalho dos historiadores, arquivistas, museólogos “pode ser o início de um novelo que se desemaranha, tanto no campo da pesquisa e arquivologia, como no campo da educação histórica patrimonial”.

     Na XII Mostra, Francisco Cougo Jr. apresentou o trabalho Reflexões arquivísticas sobre o acervo do Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore (IGTF). Segundo o autor, ao escrever sobre a trajetória do Instituto, o IGTF pode ser considerado o maior repositório documental público sobre a “música gauchesca”. Neste artigo, ele abordou a formação do acervo, as condições de guarda, de arranjo, preservação, acesso e difusão dos registros custodiados pelo IGTF. Além de divulgar o arquivo, teve como objetivo refletir sobre a inexistência de métodos arquivísticos na organização do fundo e as divergências conceituais existentes na forma como a instituição vê o repositório de fontes primárias. Por fim, a partir de um exercício hipotético, esboçou um possível quadro de arranjos para organização da documentação e a necessidade de um diálogo entre os responsáveis pela administração do instituto e o poder público, uma vez que acredita na finalidade cultural que desempenha o IGTF.

     No mesmo evento, última Mostra ocorrida até o momento, Paola Laux e Renata dos Santos de Mattos apresentaram o trabalho Os arquivos sobre a repressão: o sequestro dos uruguaios no acervo particular Omar Ferri. Aborda a trajetória de Omar Ferri enquanto advogado dos uruguaios, Lilián Celiberti e Universindo Díaz, sequestrados em Porto Alegre, no ano de 1978 pelas polícias políticas gaúcha e uruguaia. Doado pelo próprio advogado ao Arquivo Histórico do RS nos anos 2000, o conjunto documental faz parte do Acervo da Luta contra a Ditadura e passou pelo processo de ordenação cronológica, higienização, desmetalização e descrição das dezesseis caixas. O acervo é composto por jornais, revistas, processos, correspondências. A partir das características do acervo documental, refletem sobre a importância dos arquivos da repressão “na reconstituição da história e memória coletiva, na consolidação da democracia e dos Direitos Humanos”.

     Como o leitor pode notar, muitos foram os trabalhos que, até o momento, abordaram a temática dos arquivos (isso que não mencionamos todos os artigos aqui!). Com certeza, trata-se de uma problemática muito mais que bem-vinda à Mostra. Esperamos por outras apresentações que tratem do assunto na XIII Mostra de Pesquisa!!!

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